De repente, Rap!
Poderia ser só poesia, mas é RAP, Rhythm And Poetry (ritmo e poesia), o gênero musical que surgiu na Jamaica na década de 1960, se consolidou e ganhou o mundo a partir dos anos 70, nos Estados Unidos.
No projeto De repente, Rap!, idealizado pelo professor Fábio Brazolin Abdulmassih, de Estudos Linguísticos e Literários do Ensino Médio, os alunos percorreram a trajetória de um dos movimentos culturais mais completos, que envolve música, dança e artes plásticas: o Hip Hop. Além disso, se aprofundaram em um recorte específico, o rap, e também reconheceram na literatura popular, com os cordéis e o repente, importantes referências para esse estilo musical no Brasil.
Por meio do estudo da arquitetura dos repentes e cordéis que, por analogia, envolvem um processo mental similar ao Rap demonstrado nas “batalhas”, duelo com versos improvisados entre dois rappers, os alunos desenvolveram a confiança e as técnicas necessárias para improvisar e rimar suas mensagens.
Para entender as origens do Rap, as aulas contemplaram os estudos sobre os movimentos sociais relacionados aos direitos civis no fim dos anos 60, nos guetos da cidade de Nova York. As péssimas condições em que negros, latinos e demais imigrantes viviam, responsáveis por um derramamento de sangue e violência gratuita entre gangues na cidade, foram o estopim para o nascimento do Hip Hop.
Foi devido à capacidade pacificadora de unir gangues rivais por meio da música e das festas e de apresentar formas de expressão que dariam voz às minorias que o RAP apareceu nos Estados Unidos, trazido pelo jamaicano Kool Herc, logo se consolidando no movimento. No Brasil, os primeiros shows aconteceram em meados dos anos 80, em São Paulo.
Sempre impulsionados por temas atuais e do cotidiano, durante as aulas, os alunos fizeram diversos exercícios de improviso e, com o desafio de produzir, ensaiar e encontrar o beat perfeito, apresentaram suas produções, individualmente ou em grupo. Mais do que divertido e prazeroso, preparar um Rap exige um compilado de esforços cognitivos, um bom vocabulário, um conhecimento prévio sobre o assunto e muita criatividade.
Além dos objetivos tangíveis do projeto, os alunos trabalharam a organização de ideias e a desinibição e identificaram valores importantes, como respeito e tolerância, para a construção de uma sociedade pacífica.
A consciência da cultura Hip Hop com Marcelo Gugu
Em 7 e 14 de junho, o MC (mestre de cerimônias) Marcelo Gugu veio ao Colégio Miguel de Cervantes para conversar com os alunos do Projeto. O primeiro encontro contou com a participação dos jovens rappers profissionais Bruno e Andrade para uma demonstração de "batalhas".
Durante os encontros, Gugu falou sobre o desenvolvimento da consciência da cultura Hip Hop, percorrendo a trajetória do racismo no berço da escravidão na América. O MC falou sobre a imposição da cultura colonial e no processo psicológico que envolveu a desumanização do negro para a legitimação da escravidão, que repercute até hoje como herança de intolerância e discriminação.
Nos encontros, Gugu falou sobre a organização das festas que tiraram as gangues das ruas e dos principais expoentes nesse processo, como o americano Kevin Donovan. Conhecido como Afrika Banbaataa, Kevin é fundador da Zulu Nation, ONG que desenvolve projetos sociais e campanhas antirracistas, além de divulgar a cultura Hip Hop pelo mundo.
Marcelo Gugu também deu uma oficina de produção de texto e improvisação, realizando exercícios de improvisação e organizando batalhas com os alunos.
Fotos: Tatiana Maria de Paula Silva
Hip Hop, de Repente no Brasil
O movimento Hip Hop nasceu nos EUA e difundiu-se em todo o mundo, levando mensagens de luta contra opressão e também diversão aos subúrbios.
No Brasil, o movimento começou em São Paulo na década de 80: jovens da periferia se reuniam nas Praças da Sé e Roosevelt, nas ruas Dom José de Barros, 24 de Maio e na Estação São Bento do Metrô para dançar e improvisar Raps.
Desses encontros saíram muitos artistas reconhecidos, como a dupla Thaíde & DJ Hum, Racionais MC’s, Rapping Hood e Sabotage. As músicas descrevem o cotidiano duro da vida da periferia, além de protestarem em nome dos jovens que, sem apoio do Estado, acabavam recrutados por organizações criminosas.
É indiscutível, no entanto, que música e a poesia são elementos expressivamente vivos na cultura popular brasileira. Anteriores ao movimento Hip Hop, originários da influência da cultura europeia na colonização do Brasil, o Repente nordestino e a literatura de cordel são expressões artísticas tradicionais em nosso país.
O Repente, rico em variações de métricas, é um gênero composto, majoritariamente, por rimas improvisadas em que os cantores buscam atingir o oponente. Como nas batalhas de Rap, o principal talento é a agilidade de pensamento e riqueza de vocabulário.
O Cordel é um gênero literário popular com estrofes de dez, oito ou seis versos em que os cordelistas relatam histórias do cotidiano. O formato original europeu apresentava as produções penduradas em cordões nas feiras e festas populares, daí a origem do nome. Contudo, o formato mais comum no Brasil é em folhetos.
Nos encontros do projeto, os alunos puderam conhecer mais sobre essas manifestações culturais e produziram folhetos com cordéis de temas escolhidos por eles.
Para o aluno Leonardo Bernardes Mandia, do 1º B, os exercícios auxiliaram bastante as aulas de produção de texto. Ele acredita que para ser um bom rapper é necessário ler bastante e ter conhecimentos gerais. Já para o aluno Eduardo Lima Pinelli, 1ºC, ter um bom vocabulário é fundamental para a construção de boas rimas. Para ele, o projeto foi muito interessante. "Tive a oportunidade de conhecer a história o Hip e Hop e de Rappers famosos", conta Eduardo.
O aluno João Guilherme Garcia Gorski, do 1ºA, que sempre se interessou pelo gênero Rap, afirma que o projeto superou as expectativas. "Eu escolhi participar do projeto porque é o meu gênero musical favorito e queria aprender mais sobre a história e a cultura Hip Hop. O conteúdo contribuiu para o meu aprendizado com conhecimento geral e também me ajudou a ver o mundo de um jeito diferente, mais aberto", comenta João. Ele acredita que para ser um bom rapper é necessário criatividade e originalidade.
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Marcello GuGu, rapper brasileiro nascido em São Paulo começou carreira aos 14 anos, e destacou-se no freestyle (modalidade de rap aonde as letras são feitas de improviso, baseadas no que se vê, se sente ou se imagina, semelhante aos repentes nordestinos). Fundador da Batalha de MCs do metrô Santa Cruz. É idealizador do projeto "Infinity Class" na Fundação CASA (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente), prestando assistência a jovens de 12 a 21 anos.